sexta-feira, agosto 11, 2006

Que fosse à velocidade com que me passa uma noite de insónias. Só isso, que quando voltasse fosse assim, devagar, a pôr os pés no chão a medo. Achas que é possível?
A voz distinta e rouca do abandono vem direitinha, tal qual está quando a empurramos como quem afasta migalhas na toalha, os dedos a repetirem-se, a ver se um espaço sem chegadas abruptas do que já foi, porque apenas quase tudo se toma amargo, como dizias.
Mas o que te queria contar era que hoje ia com passos de ritmo de estou cheia de pressa, a contornar carros, gente, sacos, tudo perfeito, no encaixe certo, quando me pára um senhor a travar o passo já pensado, de lábios esticadinhos para os lados.
Dizia-te sem estremecer, sem ser de repente. Achas que é possível? Que a memória pode vir a arrastar, mas sem fazer ranger as tábuas?
E fiz-lhe o mesmo. Ao senhor. E deu-me jeito. Porque tinha já o olho a fugir para o fim da rua e, quando começo assim, desfaço tudo, fico convicta de não tenho pressa, a carregar as palavras que se sabe que existem, de que falavas, como se estivesse a escrever e a alma cada vez mais lá. Assim, sempre o fim da pressa mais ao longe, com o sorriso pelo meio.
Mas é de repente, quando se chega, quando se pára sem ninguém à frente. Vozes, cheiros. Abrupta. Intacta. Como se não consegue ouvir as palavras. A bater os pés, a memória.
Por isso, deu-me jeito.

2 comentários:

Júlia disse...

Como que a entrelaçar-se com que se diz. Obrigada por nos ler e ouvir.
Um beijinho.

Júlia disse...

Obrigada pelo comentário. É bom saber que alguém também queria dizer o mesmo - como se uma companhia.
Também visitei o seu blogue e gostei muito, muito.